quarta-feira, 10 de novembro de 2010

A gloriosa desgraça

O País e o Benfica, não andam nada bem.
Que ambos costumam andar interligados já se sabia e era adquirido
E mais uma vez assim acontece.
Andamos mal governados no país e para disfarçar dizem-nos que os mercados nos impõem implacavelmente o que querem e o que querem é só aquilo.
Os juros com que alimentam a sua agiotagem.
Mas exactamente por ser de agiotagem que se trata, é sabido que o desejo é insaciável.
E isso, todos sabiam, mais ainda quem nos pretende vender essa inevitabilidade. E assim nos fomos vergando quando nas últimas semanas os agiotas nos iam dizendo das dificuldades em nos emprestar o que precisamos ao mesmo tempo que acenam com as notas que já sabem que nos vão emprestar a um preço cada vez mais alto. Neste caso a semelhança é grande com o que acontece nas redondezas dos casinos.
Mas andamos mal e enganados com o conluio entre os agiotas profissionais e os profissionais do descalabro que todos os dias com as suas decisões alimentam o ciclo vicioso com que também se alimentam a si próprios enquanto todos nós os vamos suportando.
E como ficou provado os mercados têm vida e vontade própria e não se acalmem na sua voracidade, antes sugam enquanto podem sugar, quais vampiros insaciáveis.
Hoje por isto, amanhã por aquilo, haverá sempre uma desculpa que não colhe mas pretende justificar o que nos pretendem impingir; a nossa vida em troco da boa vida deles.
Haverá tempos em que talvez nos possamos libertar dos zezinhos e dos pedrinhos deste país e deixemos de nos submeter a esse seu canto de sereia viciado.
Por agora suportaremos cabisbaixos, como sempre, os seus dislates e submeter-nos-emos mansos às suas ignomínias caprichosas.
Mas para que tudo corra com normalidade e dentro do habitual, também e ao mesmo tempo que o país soçobra, o Benfica anda mal e desventurado, por força dos luisinhos que, para disfarçar as suas decisões, nos vendem as suas inevitabilidades boçais.
E também aqui e mas uma vez, o malfadado mercado é que é o causador das nossas gloriosas desgraças.
Impuseram-nos um guarda-redes de milhões de euros, enquanto o curriculum não tinha mais do que duas ou três linhas de pouca história.
Impuseram-nos a compra de dois rapazolas pequenos do país das pampas por milhões inversamente proporcionais à sua categoria.
E curiosamente também esse mercado, qual outro agiota que nos acena constantemente com os seus negócios gulosos e escorregadios, mas que constantemente o Benfica alimenta, prospera e não perdoa.
Neste caso a entidade mais visível e descarada tem apelido e residência: é de Madrid e Atlético.
Nos últimos anos satisfizemos-lhe quatro negócios de milhões, em jeito de conta corrente.
No Simão ainda faltam dois ou três milhões que ficaram de vir e nunca mais se falou deles, para além do direito de opção em jogadores.
No Reys compramos aos mesmos por milhões parte do passe de quem se ia embora para não mais voltar, qual doação a um filho querido.
No Roberto, pagamos o preço que ninguém acredita ser possível, menos ainda para um guarda-redes que como diz o povo é grande mas não é grande coisa e que já nos fez perder o campeonato com as derrotas das primeiras jornadas, que não mais recuperámos, para além dos disparatados voos que ensaia a sair da baliza, mais parecendo uma ave de capoeira que uma águia real.
Com Salvio foram mais uns milhões com um empréstimo duvidoso e pouco claro.
Enfim, é sempre a aviar.
Estranho este mercado madrilista em que um despacha e o outro paga sem ver ou bufar.
Talvez tamanha generosidade dos luisinhos tenha contrapartida oculta lá para os lados de Madrid.
Para ele, claro.
A verdade é que a similitude entre o País dos zezinhos e pedrinhos e o Benfica dos luizinhos, emana da generosidade dos mandantes destas duas entidades para com os mercados insaciáveis, alimentando-os, satisfazendo-lhes as vontades, enganando-nos e vendendo-nos a inevitabilidade e a bondade das acções dos ditos.
Será só convicção, ou também acção? Acção espúria, entenda-se.
Em tempos de crise selectiva, em que alguns desvariam, poucos e sempre os mesmos gozam e os outros, muitos, pagam e desesperam, País e Benfica, portugueses e benfiquistas, parecem estar unidos num fado rasca, desgraçado e que não merecem, mas admitem e com que se vêm conformando.
O que parece óbvio é que para que a nossa felicidade volte, no país e no Benfica e sem uma a outra não resulta, é preciso convencer os mercados nossos amigos da bondade em nos adquirirem de borla e já amanhados os zezinhos, pedrinhos e luisinhos, todos eles “good felows” e proporcionarem-nos, enfim, alguma paz e sossego.
Acreditam nisso? Eu não.
É que é preciso não esquecer que os mercados, todos eles, não costumam transigir e quando toca a piar fino não facilitam e tal como quando aprovaram o tal orçamento eles não ligaram peva e continuaram a espremer-nos, também agora se quisermos que eles fiquem com os nossos embrulhos pútridos, obviamente que nos vão, olimpicamente, ignorar e, rindo, continuarão a manter-nos a distância respeitosa e à mercê dos seus interesses. Futebolísticos e políticos, porém e sobretudo mercantis.
Citizen red, 09/11/00.